segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Os Princípios da Reforma – parte I

Introdução

A Reforma Protestante do século XVI tem como seu marco histórico inicial uma atitude de um monge chamado Martim Lutero. No dia 31 de Outubro de 1517 Lutero afixou na porta da catedral de Wittenberg, na Alemanha, suas 95 teses. Esta atitude era a forma daquele tempo para convidar pessoas interessadas ao debate sobre um determinado tema.

As 95 teses de Lutero tinham como tema central à questão das indulgências e ninguém se prontificou a debater com Lutero o tema, porém, sua atitude trouxe profundas implicações, pois em pouco tempo as 95 teses foram conhecidas por quase toda a Alemanha. E isto, como também outros escritos seus, culminaram na sua ex-comunhão da ICAR (Igreja Católica Apostólica Romana).

A Reforma foi um movimento amplo e perfez inúmeras implicações na vida religiosa, moral, ética, econômica, política e etc... A Reforma como movimento religioso, apresentou cinco princípios fundamentais, que são conhecidos através de expressões em latim: Sola Scriptura, Solus Christus, Sola Gratia, Sola Fide e Soli Deo Gloria.

Destarte, é importante ressaltar que a atitude de Lutero e dos outros reformadores, que culminaram nos cinco princípios da Reforma, atingiram o cerne do problema existente na ICAR, a saber: o distanciamento da Palavra de Deus, das Escrituras. A ICAR ao se distanciar das Escrituras estava apresentando inúmeros desvios e males.

É por isso que hoje iniciaremos o estudo sobre os cinco princípios da Reforma apresentando como primeiro princípio o Sola Scriptura, que significa “Somente a Escritura” ou a autoridade e suficiência das Escrituras.bíblia

1º Princípio: Sola Scriptura - “Somente a Escritura” ou a autoridade e suficiência das Escrituras

1) A Autoridade

O princípio Sola Scriptura em primeiro lugar aponta para uma importante questão, a Autoridade das Escrituras. A ICAR entendia, e entende até hoje, que a Bíblia é a Palavra de Deus e é importantíssima. Porém, ao lado das Escrituras, no mesmo nível de importância e autoridade, coloca a tradição. A tradição são as decisões dos diversos concílios e do Papa, quando este fala oficialmente (ex cathedra) em matéria de fé e moral.

É justamente neste aspecto que há uma imensa divergência entre os postulados reformados e a ICAR. Os reformadores e as igrejas oriundas da Reforma entendem que as Escrituras, a Palavra de Deus, é a única regra de fé e prática, ou seja, não há nada que tenha a mesma importância e autoridade que as Escrituras.

É importante ressaltar que isto não quer dizer que os reformadores negaram e negligenciaram a história, as decisões dos concílios e os costumes da Igreja de Cristo. Os reformadores entenderam que tudo isto era importante, no entanto, deveriam ser colocados sob a autoridade das Escrituras, deveriam ser entendidos, aceitos e avaliados a partir das Escrituras.

A autoridade das Escrituras é intrínseca para os reformadores, não depende da Igreja ou qualquer pessoa assentir a Sua autoridade. Isto porque, como diz 2 Pedro 1,21, ela foi escrita por homens santos inspirados pelo Espírito Santo e assim, é a revelação do próprio Deus.

2) A Superioridade das Escrituras

Outra questão importante apresentada neste princípio é a superioridade das Escrituras. A própria Palavra de Deus mostra, como no Salmo 19,1-2, que Deus é revelado através de toda a criação. No entanto, esta revelação não é suficiente para a salvação. Esta só é possível através da Revelação Especial de Deus, ou seja, a Sua Palavra, as Escrituras.

Isto também é visto na própria Palavra de Deus, em vários versículos. No Salmo 19 mesmo isto é mostrado nos vv.7-11. Também em 2 Timóteo 3,16-17; Romanos 15,4. Assim, conseguimos entender mais acuradamente o que é a Palavra de Deus. Ela é a revelação de Deus, a revelação de Deus salvando o ser humano.

3) O Centro das Escrituras e a sua Chave

As Escrituras possuem apenas um centro, ou seja, tudo gira em torno de uma pessoa apenas, Jesus Cristo. Em toda a Escritura Cristo está presente, pois Ele é o centro. Ademais, a chave de leitura da Palavra de Deus é também Cristo, ou seja, para entendermos as Escrituras é preciso saber que Jesus Cristo é o meio pelo qual isto é possível. Ele mesmo disse isto em João 5,39.

4) O livre exame

Os reformadores também apresentaram uma importante questão, o livre exame. A ICAR entendia que a Bíblia não devia ser lida pelos leigos, porque julgava que eles não seriam capazes de entender, como também, seria até perigoso deixar que qualquer pessoa lesse.

Foi na Reforma que as Escrituras passaram a ser traduzidas para as línguas vulgares, pois os reformadores acreditavam que Deus, através do Espírito Santo, iluminava a mente e os corações dos pios crentes.

É importante ressaltar que o livre exame não é uma licença para que cada um faça a sua interpretação subjetiva e exclusivista, porque Deus não é Deus de confusão, de ambigüidade. Por isso, a história da Igreja é importante, por isso Deus levanta, até hoje, homens escolhidos para equipar, aperfeiçoar e ensinar a Igreja, como nos mostra Efésios 4,11-12.

Além disto, uma regra importante que os reformadores nos deixaram para a interpretação das Escrituras é: Doutrina não é formada a partir de apenas um versículo e também, a Escritura interpreta a própria Escritura, ou seja, os versículos mais claros esclarecem os mais obscuros.

5) Implicações hodiernas

Hoje em dia a Bíblia alcançou um nível de divulgação elevadíssimo. O que poderia nos acalmar e nos fazer entender que o princípio de Sola Scriptura não seja mais tão importante quanto o foi. Todavia, hoje também é o tempo que este princípio deva ser relembrado, vivido e entendido, porque apesar da grande divulgação, as Escrituras têm sido cada vez mais deixadas de lado. Isto de duas maneiras, basicamente:

a) Pelos conhecidos como liberais, que atacam e tentam com grande força destruírem a autoridade da Palavra de Deus, afirmando que nela há erros e coisas do tipo.

b) Pelos neo-pentecostais, que apesar de lerem versículos bíblicos, fazem pregações e ensinam muitas coisas que são contraditórias ao ensino das Escrituras, ou pregam apenas mensagens de auto-ajuda, para alegrar pessoas e apaziguar os corações. Além disto, também apresentam profecias e revelações que não estão na Bíblia, que contradizem a Bíblia e muitas vezes ganham notoriedade, importância e autoridade igual a da Palavra de Deus.

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Conclusão

Para concluir, vamos mostrar o que a Confissão de Fé de Westminster fala a respeito da Bíblia:

Ainda que a luz da natureza e as obras da criação e da providência de tal modo manifestem a bondade, a sabedoria e o poder de Deus, que os homens ficam inescusáveis, contudo não são suficientes para dar aquele conhecimento de Deus e da sua vontade necessário para a salvação; por isso foi o Senhor servido, em diversos tempos e diferentes modos, revelar-se e declarar à sua Igreja aquela sua vontade; e depois, para melhor preservação e propagação da verdade, para o mais seguro estabelecimento e conforto da Igreja contra a corrupção da carne e malícia de Satanás e do mundo, foi igualmente servido fazê-la escrever toda. Isto torna indispensável a Escritura Sagrada, tendo cessado aqueles antigos modos de revelar Deus a sua vontade ao seu povo.

Sob o nome de Escritura Sagrada, ou Palavra de Deus escrita, incluem-se agora todos os livros do Velho e do Novo Testamento, que são os seguintes, todos dados por inspiração de Deus para serem a regra de fé e de prática:

A autoridade da Escritura Sagrada, razão pela qual deve ser crida e obedecida, não depende do testemunho de qualquer homem ou igreja, mas depende somente de Deus (a mesma verdade) que é o seu autor; tem, portanto, de ser recebida, porque é a palavra de Deus.

Pelo testemunho da Igreja podemos ser movidos e incitados a um alto e reverente apreço da Escritura Sagrada; a suprema excelência do seu conteúdo, e eficácia da sua doutrina, a majestade do seu estilo, a harmonia de todas as suas partes, o escopo do seu todo (que é dar a Deus toda a glória), a plena revelação que faz do único meio de salvar-se o homem, as suas muitas outras excelências incomparáveis e completa perfeição, são argumentos pelos quais abundantemente se evidencia ser ela a palavra de Deus; contudo, a nossa plena persuasão e certeza da sua infalível verdade e divina autoridade provém da operação interna do Espírito Santo, que pela palavra e com a palavra testifica em nossos corações.

Todo o conselho de Deus concernente a todas as coisas necessárias para a glória dele e para a salvação, fé e vida do homem, ou é expressamente declarado na Escritura ou pode ser lógica e claramente deduzido dela. À Escritura nada se acrescentará em tempo algum, nem por novas revelações do Espírito, nem por tradições dos homens; reconhecemos, entretanto, ser necessária a íntima iluminação do Espírito de Deus para a salvadora compreensão das coisas reveladas na palavra, e que há algumas circunstâncias, quanto ao culto de Deus e ao governo da Igreja, comum às ações e sociedades humanas, as quais têm de ser ordenadas pela luz da natureza e pela prudência cristã, segundo as regras gerais da palavra, que sempre devem ser observadas.

Na Escritura não são todas as coisas igualmente claras em si, nem do mesmo modo evidentes a todos; contudo, as coisas que precisam ser obedecidas, cridas e observadas para a salvação, em um ou outro passo da Escritura são tão claramente expostas e explicadas, que não só os doutos, mas ainda os indoutos, no devido uso dos meios ordinários, podem alcançar uma suficiente compreensão delas.

O Velho Testamento em Hebraico (língua vulgar do antigo povo de Deus) e o Novo Testamento em Grego (a língua mais geralmente conhecida entre as nações no tempo em que ele foi escrito), sendo inspirados imediatamente por Deus e pelo seu singular cuidado e providência conservados puros em todos os séculos, são por isso autênticos e assim em todas as controvérsias religiosas a Igreja deve apelar para eles como para um supremo tribunal; mas, não sendo essas línguas conhecidas por todo o povo de Deus, que tem direito e interesse nas Escrituras e que deve no temor de Deus lê-las e estudá-las, esses livros têm de ser traduzidos nas línguas vulgares de todas as nações aonde chegarem, a fim de que a palavra de Deus, permanecendo nelas abundantemente, adorem a Deus de modo aceitável e possuam a esperança pela paciência e conforto das escrituras.

A regra infalível de interpretação da Escritura é a mesma Escritura; portanto, quando houver questão sobre o verdadeiro e pleno sentido de qualquer texto da Escritura (sentido que não é múltiplo, mas único), esse texto pode ser estudado e compreendido por outros textos que falem mais claramente.

O Juiz Supremo, pelo qual todas as controvérsias religiosas têm de ser determinadas e por quem serão examinados todos os decretos de concílios, todas as opiniões dos antigos escritores, todas as doutrinas de homens e opiniões particulares, o Juiz Supremo em cuja sentença nos devemos firmar não pode ser outro senão o Espírito Santo falando na Escritura.

Rev. Marcio Tenponi Pacheco

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